BAPHOMET
TEM.´.OHP.´.AB, Baphomet é um acróstico ou sentença iniciática que significa
O Pai do Templo, a Paz de todos os Homens ou TEMPLI OMNIUM HOMINUM
PACIS ABBAS.
Descrição Analítica - Parte 1
Entre os cornos de Baphomet vemos a tocha, porque ele é
o Dadouches, o principal iniciador de Eleusis, o portador da tocha, o
Phosphoros Grego, aquele que trás a luz da Iniciação, associado a Prometeu,
que furtou de Zeus o fogo sagrado (DCJCK), e deu-o aos homens. Para os
romanos ele é LVCIFER, aquele que trás a luz. Note-se que tais significações
estão no seu sentido original, i. e., não maculadas pelo sentido cristão.
Como portador da luz, representada pelo fogo, teremos
que nos focar nas significações deste elemento, uma vez que a tocha existe em
função do fogo. É também o chakra Sahasrara, o lótus de mil pétalas.
CAPUT (Cabeça)
Quem trouxe o fogo aos homens foi Prometeu, segundo o registro de Heródoto em “Os Trabalhos e os Dias”. Tal episódio reproduz com outra simbologia a passagem do Atharva Veda, 12, 2, que proclama: “O Deus Agni escalou os cimos celestiais/ e ao liberar-se do pecado/ ele nos libertou da maldição”. Assim teremos uma semelhança entre Agni e Prometeu, ambos como seres benfazejos ao homem. Agni (raiz etimológica de Ignis = fogo eml atim, veja também que “puro” e “fogo” tem a mesma palavra no sânscrito) é apenas um aspecto do fogo, pois há no hinduismo, três espécies: primeiro Agni, o fogo em si-mesmo, o segundo Indra,o raio e o terceiro Surya, o fogo como Sol, portanto, estes são os arquétipos do fogo terrestre, intermédio e celestial. Seja qual for o aspecto, o fogo (Pyr em persa, πυρ em grego), guarda estreitas relações com os ritos de regeneração e purificação (note aqui a raiz etimológica), portanto, de Iniciação.
Assim a tocha de Baphomet acende o Athanor filosófico, o cadinho onde é gestada a pedra filosofal que será triturada para produzir o Elixir da Imortalidade (Amrita ou Soma). O Athanor assim encontra-se no coração, pois este é o centro do Manipura-chakra, cujo símbolo é triangulo ígneo, segundo os Upanichads. O sistema de chakras também é encontrado no tantrismo tibetano, que consideram apenas cinco centros de força sutil, e que também associa o fogo ao coração. Além disso, o coração é a morada do espírito (Jacob Boheme), e relacionando-se com o espírito e fogo chegaremos ao Espírito Santo, que se manifesta no cristianismo como línguas de fogo no pentecostes. O Logos manifesto. Note que o Espírito Santo é relacionado ao sêmem, pois no BAHIR (Cabala) é dito que o sêmen provêm do cérebro e caminha pela espinha até o falo, este também um símbolo cognato (φαλοσ é um cognato de πιραµισ onde ocorriam iniciações).
No judaísmo, as ofertas ao Tetragrammaton eram queimadas, pelo que nos explica Abu Ya’qub Sejestani, o fogo eleva as coisas ao estado sutil (espiritual) pela combustão do invólucro grosseiro, assim tanto se presta a trazer aos homens o Logos, quanto a levar aos deuses a essência. Vejamos também como tal o sentido dos ritos fúnebres, a cremação dos corpos entre os gregos e os hindus tem o mesmo significado, pois o fogo é não apenas um elemento purificador ou regenerador, mas também seu toque assegura a passagem de um estado a outro. Ainda, o fogo da tocha de Baphomet é o fogo que consome, o fogo devorador, o αγαπε, um dos três aspectos do Amor, segundo Platão (εροσ e φιλοσ são os outros dois), e justamente o aspecto cósmico do amor, e não apenas o sexual (εροτοσ) ou o moral (φιλια). O αγαπε é o amor que leva o Adepto ao auto-sacrifício espiritual, simbolizado pelo ARCANO XII do TARO.
Por fim, sendo o fogo um símbolo do intelecto ou logos, ou de Tipheret para os qabalistas, o sentido pleno só pode ser compreendido em relação aos dois chifres, formando assim um ternário, como nos desvelou E. Lévi. Sem o a tocha, os chifres significam a díada, o dois, o número que, tomado em si mesmo, é a dualidade, o mal (διαβολοσ, origem etimológica de diabo, significa aquele que divide). Em seu aspecto negativo é TOHU V-BOHU (ובהו תהו) o vazio e o amorfo, cujo valor é 430, o mesmo de nephesh (נפש), a alma animal (irracional) do homem.
A tocha entre os chifres sendo o Espírito Santo, RUACH HÁ-KODESH (הפדש רוח), que organiza o vácuo e a matéria, reconciliando o Caos primordial. (Compare com a passagem do Gênesis I, 2.) Sendo o chifre um símbolo do Poder (em hebraico קרנ=chifre, poder, força, provável raiz etimológica da palavra latina “cornu”), sem o Espírito reconciliador, o poder é dividido, e não subsiste, além do que são de caráter lunar e não solar, pois são de touro para alguns, e de cabra para outros, ambos símbolos ligados a terra e seu aspecto fecundo, também ligado à fertilidade e daí a sexualidade, dividida em papéis ativo e passivo. Segundo René Guénon, a associação entre o Touro e a Lua era familiar aos sumérios e também aos hindus, sendo reconciliada pelo crescente lunar, presente em ambos os panteões. Para os hindus o Mahabharata identifica Shiva com sua montaria, o Nandi, ou touro sagrado. Em representações mais antigas, Shiva possui chifres.
Shiva Pashupata, o criador do Yoga.
O Amom egípcio, o deus oculto, era chamado no livro dos mortos de “Senhor dos dois chifres”, mas estes são de caráter solar, chifres de carneiro, conforme se tem pelas representações de Apolo Karneios e mais tarde Dionisos. Segundo Jung o chifre reconcilia, em si mesmo, os papéis ativo e passivo, respectivamente pela força de penetração e por sua abertura em forma de receptáculo. Nas religiões persas encontramos Mitras imolando o touro, o pai de todas as coisas. Esta relação entre o touro e Mitras encontra uma ressonância em Baphomet que para alguns ocultistas induz a plena identificação de ambos os seres. Crowley dizia, citando Von Hammer-Purgstall, que Baphomet era originalmente grafado com um “r” solar no fim da palavra, assim teríamos Baphometr (?) ou Baphomitr (?), que significava “pai Mitra”, e ele era um deus touro ou matador de touros. Além disso, Mitra era uma divindade solar dos persas, na realidade ele não matava o touro, mas o sacrificava, fazendo deste animal, entre os orientais, um animal solar, em contraposição a natureza lunar do mesmo touro entre os babilônios, embora ambos estejam relacionado à fertilidade, aos ciclos do das estações e a agricultura.
Resumidamente, os poderes dos chifres lunares de Baphomet poderiam ser tomados como as forças ativas e passivas da natureza, balanceadas pelo intelecto ou Logos. O Adepto ou iniciado deve possuir esses atributos, sendo essa a natureza do Bodhisattva, termo sânscrito (em tibetano Diang Shuv Sempa), que significa “aquele cujo espírito é desperto (a tocha) e que age com coragem (os chifres)”.
O simbolismo dualista presente no glifo nos indica a princípio o caráter andrógino do ídolo. Nele estão presentes, além dos signos duplos dos braços, chifres, luas, etc., a unidade dos dois sexos, representados pelos seios e pelo falo, ou lingan, em forma de caduceu. Os traços da androginia são presentes em muitas divindades como Adônis, Dioniso, entre outros. Não é um ser assexuado, como quer o modelo do cristianismo (suprimindo falo e pondo um caduceucomo signo cognato), mas explicitamente bissexual, conforme podemos observar nas divindades gregas. Zeus teve “casos” com mortais e imortais de ambos os sexos, Dioniso o fazia igualmente.
O lingan tântrico é representado muitas vezes com a Yoni em seu corpo. Shiva e Shakti abraçam-se e tornam-se Adha-Nari, o ser primordial. Veja também os diálogos de Platão, especialmente o Banquete. Não apenas no paganismo encontramos tais ocorrências. O Midrash judaico também relaciona a androginia de Adam-Kadmon como um estado que é preciso reconquistar.
A cabeça do ídolo é a do Bode, animal de natureza lunar, em oposição ao carneiro solar, mas segundo Levi trás os traços do cão, do touro e do asno. Levi interpretou esses hieróglifos de uma forma demasiadamente pejorativa, associado-os a responsabilidade da matéria e a expiação dos pecados corporais; provavelmente, em relação ao bode, tenha sido inspirado pelas lendas do Bode de Zazel, o bode expiatório, e daí sua relação com o pecado. Essa significação não se esgota nisso, aliás, ela é muito mais profunda e dirige-se a rumos bem diferentes do imaginário judaico-cristão.
Isto apenas indica que o simbolismo do bode e da cabra foi extremamente degenerado do cristianismo para frente, principalmente pelo aspecto sexual da figura. Libidinosus foi a palavra usada por Horácio nos Épodos, Livro 10, verso 23, para designar o animal que era sacrificado para afastar as tempestades, ambos os símbolos associados ao desregramento e ao caos. Saint-Martin chama-o de “animal fedorento”, sinal da “abominação”, “rejeição”, “putrefação e iniqüidade”. Foi na idade média que a iconografia cristã associou o Diabo, o deus da luxúria (sexo) ao bode, em decorrência de sua absorção a necessidade de reprodução.
Na Índia, a cabra é Prakriti (matéria), a mãe do mundo (AMMA MUNDI), que possui três qualidades essenciais: sattvas, rajas e tamas. A cabra, além de sua ligação com a fertilidade (Pan, divindade arcádica da fertilidade era representado com cascos e chifres de bode) e a luxúria por sua pujança e fecundidade genésica (libido), era sagrada na maior parte das culturas antigas.
Adorada entre os babilônios em Susa como deus da fertilidade, era especialmente considerada pelos gregos como portadores de teofania, sendo sacrificada na ocasião da consulta dos oráculos. Diodoro da Sicília relata que em Delfos foram elas que chamaram a atenção dos camponeses para certos vapores que exalavam das rochas, e que faziam as cabras pular de modo bizarro e incomum. Sobre estas rochas eles fundaram um oráculo. Ainda entre os gregos, é conhecida a tradição órfica que a alma iniciada é como um cabrito caído dentro do leite. O bode é especialmente caro também a Dioniso, uma vez que além de ser sua oferenda predileta, foi na forma de um bode que ele fugiu de Typhon, indo para o Egito.
O simbolismo do bode se liga de forma sutil ao do fogo, vez que ambos são considerados elementos essenciais dos ritos de Iniciação. Ainda no Atharva Veda, 9, 5 vemos tal associação de modo claro: “o bode é Agni; o bode é o esplendor/que afasta as trevas para longe./ ó bode, sobe ao céu dos homens justos”.
Além do que os bodes são exímios em escalar grandes montanhas ou picos rochosos. Seu equilíbrio é notável e não demonstram medo algum de altura. Tais qualidades são esperadas do iniciado, mas em sentido esotérico, i. e., as alturas da sabedoria as vezes se tornam sufocantes, o ar se rarefaz, mas como o bode, no qual ele tem se convertido (a idéia é de Orfeu), ele não deve se deixar arremeter pela falta de ar nem pelo medo da altura.
Os traços de cão ou chacal são facilmente associados ao deus Anpu ou Anúbis como guia das almas ao mundo subterrâneo, Thuat. Esse processo de morrer implica o renascimento de Osíris, um cognato explícito da Iniciação. Assim Anúbis é o guardião do portal para o mundo subterrâneo, isto é, o mundo oculto, o templo onde a Iniciação ocorre para o renascimento do neófito como Osíris. Vemos o cão no mesmo posto na mitologia grega, onde haveremos de encontrar Cérbero, o cão de três cabeças do Hades, um monstro mitológico, afável para os que chegam, brutal e feroz para os que tentam escapar. Além disso, para os profanos o principal atributo do cão é a fidelidade, que para um iniciado é uma das principais virtudes. Assim o iniciado tem estes atributos do cão como elementos do seu juramento: ser fiel a ordem, e guardar as portas do templo contra a curiosidade dos profanos.
Ainda ligado ao mundo dos mortos, veremos que na Índia o asno aparece como o asura Dhenuka, ligado a Nairrita, guardião da região dosmortos e Kalaratri, aspecto sinistro de Devi. O asno era relacionado comumente a ignorância na maioria das culturas antigas. Apuleio, no livro O Asno de Ouro, mostra-nos Lúcio, apaixonado por uma cortesã, sendo transformado em asno, que segundo Jean Beaujeu, é “a manifestação concreta, o efeito visível e o castigo de seu abandono ao prazer da carne”.
Concluímos assim que o asno está intimamente ligado aos aspectos bestiais da força sexual. Mas no quesito relacionado à Iniciação, encontramos o asno relacionado a Baco. Aristófanes, no poema As rãs, coloca estas palavras na boca do deus: “eu sou o asno que carrega os mistérios”, e, conhecendo as relações das lendas de Cristo e Dioniso ou Baco, teremos um paralelo com a celebração da festa dos ramos, quando o Cristo (que representa um grau e não uma pessoa) adentra as portas da cidade sagrada montado numa mula (um asno “castrado” para os freudianos).
No cristianismo-gnóstico o asno é um animal sagrado, uma vez que, além de carregar o Cristo na sua sagração pública, aparece em sua natividade e na fuga para o Egito. Neste âmbito judaico cristão, o asno esta também associado a Saturno, o segundo sol, que é a estrela de Israel. Saturno portanto é identificado com o Tetragrammaton. Por sua vez, Saturno se relaciona com Set, o deus Egípcio que era adorado nos desertos do sul na forma hierática de um deus com cabeça de asno. Finalmente, quanto a natureza do glifo, não parece ser um animal lunar, mas solar, uma vez que é associado comumente pelo tamanho de seu pênis a Príapos, uma divindade grega da fertilidade e da agricultura, de natureza solar-fálica, como todos os deuses solares, que são também relacionados ao falo.
Por Ifá Korede Emerson Fernandes
Fontes:
A Cabala - Eliphas Levi
Baphomet - Um Ensaio Analítico Simbólico (Frater Iaidah Baphometo 6667)